quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Eu já morri muitas vezes e é ainda da vida que tenho mais medo...

Dorme, meu amor, que o mundo já viu morrer mais este dia e eu estou aqui, de guarda aos pesadelos.
Fecha os olhos agora e sossega — o pior já passou há muito tempo; e o vento amaciou; e a minha mão desvia os passos do medo.
Dorme, meu amor — a morte está deitada sob o lençol da terra onde nasceste e pode levantar-se como um pássaro assim que adormeceres. Mas nada temas: as suas asas de sombra não hão-de derrubar-me — eu já morri muitas vezes e é ainda da vida que tenho mais medo.
Fecha os olhos agora e sossega — a porta está trancada; e os fantasmas da casa que o jardim devorou andam perdidos nas brumas que lancei ao caminho.
Por isso, dorme, meu amor, larga a tristeza à porta do meu corpo e nada temas: eu já ouvi o silêncio, já vi a escuridão, já olhei a morte debruçada nos espelhos e estou aqui, de guarda aos pesadelos — a noite é um poema que conheço de cor e vou cantar-te até adormeceres.
(Maria do Rosário Pedreira)

Um comentário:

  1. Não desças os degraus do sonho
    Para não despertar os monstros.

    Não subas aos sótãos - onde
    Os deuses, por trás das suas máscaras,
    Ocultam o próprio enigma.

    Não desças, não subas, fica.

    O mistério está é na tua vida!
    E é um sonho louco este nosso mundo...
    (Mário Quintana)

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